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Faz algum tempo que quero abordar esse tema. Ração é um alimento ultraprocessado e, portanto, consideravelmente menos saudável do que Alimentação Natural (AN). Mas a ração ainda é a opção de alimento que melhor se encaixa na vida de muita gente, seja por conveniência, custo, manejo de muitos pets ou de cães de porte grande, falta de suporte em casa, falta de adesão do próprio animal à AN etc.

Com frequência me perguntam sobre o que levar em conta na hora de eleger uma ração. A maioria dos consumidores, incluindo os veterinários, não vai muito além do material publicitário dos fabricantes, com frequência bastante tendencioso, para decidir se uma marca merece a sua confiança.

A verdade é que não é mesmo tão fácil avaliar criticamente uma ração. Essa é uma indústria em grande parte auto-regulada que conta com um marketing hábil em ocultar pontos que não seriam bem recebidos pelo público e atualizada quanto aos termos chamativos do momento, como “superfoods”, “natural”, “orgânico” etc.

Quer exemplos? Rações cuja frente do pacote informa serem “de cordeiro” mas, ao examinar as letrinhas miúdas da composição, vemos que também contêm frango. Rações que afirmam conter protetores articulares, mas uma consulta ao rótulo informa que se trata de uma dose irrisória. E o que dizer sobre as empresas não serem obrigadas ate hoje a informar o teor de carboidrato de seus produtos? (Dá para imaginar a indústria de alimentos para humanos agindo dessa mesma forma?)

Aprender a avaliar criticamente alimentos comerciais, sejam eles rações, petiscos e até comidas destinadas a humanos, nos torna consumidores mais exigentes e mais difíceis de enganar. Isso favorece o surgimento de produtos melhores, com comunicação mais transparente – ponto para todo mundo.

Em última análise, a melhor ração é aquela que você pode pagar e que o seu pet tolera bem. Mas, se puder ir além disso, deslize as imagens desse post e veja os pontos que eu, Sylvia, considero mais importantes nessa avaliação. Te convido a ignorar solenemente a frente chamativa e publicitária do pacote e desbravar as letrinhas pequenas do verso, ou consultar essas informações no site do fabricante.

Rótulos

Nos EUA e alguns países da Europa há uma regra que determina que os ingredientes dos produtos devem ser listados no rótulo por ordem decrescente de prevalência na fórmula, ou seja, aqueles em maior quantidade aparecem primeiro.

Algumas colegas que atuam na área de rotulagem industrial me informaram que no Brasil não existe essa exigência, então por aqui é um tanto mais complicado selecionar uma ração levando a composição dela em consideração.

Mesmo que a gente parta para a tabela nutricional e verifique a porcentagem de proteína, não conseguimos identificar quanto dessa proteína total é composta por carne e quanto é oriunda de fontes vegetais como soja.

Tá aí um ponto que nós, como consumidores, deveríamos exigir das autoridades para tornar os rórulos dos produtos mais transparentes.

Carne

Você se surpreenderia com o número de rações respeitadas que incluem pouca (e por vezes nenhuma) fonte de proteína animal na composição. Como em qualquer tipo de dieta, a carne é sempre o alimento mais caro e isso faz com que alguns fabricantes procurem compensar com proteínas de origem vegetal, via de regra, nutricionalmente inferiores. Carne fresca ou carne mecanicamente separada, farinha de vísceras, ovo desidratado – são proteínas assim que eu busco encontrar na composição.

Teor de Proteína

A entidade européia FEDIAF, que publica diretrizes para a formulação de alimentos comerciais para cães e gatos, estabelece que a ração voltada ao cão adulto deve fornecer no mínimo 18% de proteína bruta e a do gato adulto, no mínimo, 25%. Esse são valores mínimos. Como estamos falando de um carnívoro oportunista (cão) e um carnívoro obrigatório (gato), prefiro valores mais altos – acima de 25% para cães adultos e acima de 40% para gatos adultos.

Rações Úmidas

Foi conferir o teor de proteína da ração úmida (em lata) e tomou um susto com valores como 8% e 12%? Calma, ela fornece muito mais proteína que isso, mas é preciso fazer um cálculo para descobrir o valor.

Veja qual é o teor de umidade (água) do alimento. Vamos supôr que seja 75%. Calcule 100 – 75% = 25%. Logo, 25% é a matéria seca da ração, que desconsidera o teor de umidade. Agora vamos calcular o teor de proteína na matéria seca.

Divida o teor de proteína bruta, vamos supôr que seja 12%, pelos 25% de matéria seca e multiplicar por 100. Logo, (12 ÷ 25) x 100 = 48%. Esse alimento fornece 48% de proteína. Nada mal!

Teor de Carboidrato

Os fabricantes não são obrigados a divulgar o teor de carboidratos das rações, mas fazendo um cálculo podemos estimá-lo. Suponhamos que uma ração para cães apresente 21% de proteína, 13% de gordura (”extrato etéreo”), 6,5% de matéria mineral e 10% de umidade. Calculo: carboidrato = 100 – 21 – 13 – 6,5 – 10 = 49,5. O teor estimado de carboidrato desse alimento é 49,5%. Prefiro rações com até 40% de carboidrato para cães e até 20% para gatos.

Alimentos Funcionais

Muitas marcas consagradas têm composições bastante monótonas, limitadas a derivados de milho, soja, trigo, um punhado de algum subproduto de origem animal, óleos, polpa de beterraba e o premix vitamínico-mineral. Conhecendo a importância dos fitoquímicos e de uma composição dietética mais diversa – ainda mais considerando que a ração é uma monodieta – prefiro as que incluem ervas, frutas, vegetais, folhas, sementes e raízes, ainda que sejam quantidades modestas.

Certos Aditivos

Corantes são completamente desnecessários e acrescidos somente para apelar aos olhos do consumidor. Estão associados a alterações comportamentais, gastrintestinais e alérgicas. Indico rações sem ingredientes transgênicos que, segundo estudos, apresentam maiores concentrações de resíduos de herbicidas (doi: 10.1016/j.envpol.2018.08.100). Da mesma forma, recomendo rações preservadas com tocoferóis ou extrato de alecrim em vez dos conservantes sintéticos B.H.T. e B.H.A.

Com ou Sem Grãos?

Prefiro rações sem milho, soja e trigo, por considerá-los potencialmente alergênicos e mais propensos à contaminação por toxinas fúngicas e resíduos de herbicidas. Arroz, aveia, quinoa e amaranto são opções que prefiro para as rações caninas; para os gatos, quanto menor o teor de amido, melhor. É importante comentar que uma ração sem grãos pode ter alto teor de carboidratos advindos de outros alimentos, como tubérculos. Para saber, calcule o teor estimado de carboidrato.

Para finalizar

Para gatos, sempre que possível, prefira dietas úmidas. A saúde renal e urinária dos felinos depende de eles consumirem água pelo alimento.

Esses são os pontos básicos que mais importam a mim na avaliação de uma ração.

Sylvia Angélico
Médica Veterinária
pós-graduada em Nutrição Animal
CRMV-SP 29945

Comunicado Cachorro Verde

As informações divulgadas em nossas postagens possuem caráter exclusivamente educativo e não substituem as recomendações do médico-veterinário do seu cão ou gato. Por questões ético-profissionais, a Dra. Sylvia Angélico não pode responder certas dúvidas específicas sobre questões médicas do seu animal ou fazer recomendações para seu pet fora do âmbito de uma consulta personalizada. Protocolos de tratamento devem sempre ser elaborados e acompanhados pelo médico-veterinário de sua confiança.

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