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Para quem não sabe, estou desenvolvendo o conteúdo de um curso inédito do Cachorro Verde, de dietas naturais terapêuticas para gatos, voltado a veterinários e zootecnistas. Será o nosso quinto curso online. Desenvolver um curso que abrange tantos aspectos exige horas e horas de estudos ao longo de meses e caba sendo uma oportunidade para eu aprofundar e reciclar intensamente meus próprios conhecimentos, o que torna a experiência estimulante e prazeirosa para mim.

Um dos tópicos de estudo que mais me atraem é a parte biológica (ou zoológica) da coisa: taxonomia, história evolutiva, anatomia, fisiologia e metabolismo. Biologia é uma faculdade que cogito cursar um dia, pelo puro prazer do conhecimento. Me encanta conhecer detalhes e peculiaridades que determinam quem é determinada espécie, sua relação com o meio e seus hábitos alimentares.

O que nos traz a essa postagem um pouco diferente das usuais. Fiquei pensando que há por aí outros entusiastas como eu, da área da Saúde ou não, que se interessam por informações deste tipo sobre esses carnívoros de estimação com os quais compartilhamos nossas vidas, o cão e o gato.

Ambos são carnívoros e descendem de predadores eficazes, mas enquanto o cão é considerado por muitos especialistas como um semi-carnívoro, carnívoro oportunista, carnívoro facultativo ou carnívoro adaptativo, o gato é um carnívoro estrito ou carnívoro obrigatório. Isso não significa de modo algum que devam comer somente carne. Carnívoros estritos, como os felinos, consomem a presa toda – músculos, órgãos, pele, ossos e até e partes mal digeridas, como bicos, penas, cartilagens e unhas. Também consomem um pouco de gramíneas e a matéria vegetal presente no trato digestivo de presas pequenas, mas não são dotados de papilas capazes de detectar sabores adocicados, como o das frutas.

Carnívoros mais versáteis, como os cães, possuem adaptações para digerir amido, ainda que de maneira mais limitada que nós, e naturalmente se interessam por uma ampla gama de alimentos de origem animal e vegetal. Na natureza, em períodos de escassez, se viram com o que encontrarem pela frente, incluindo frutinhos silvestres, fezes e carcaças em estágio avançado de decomposição.

Conheça abaixo algumas particularidades intrigantes sobre a fisiologia e o metabolismo de nossos cães e gatos.

Classificação científica

Cão

  • Reino: Animalia
  • Filo: Chordata
  • Classe: Mammalia
  • Ordem: Carnivora
  • Subordem: Caniformia
  • Família: Canidae
  • Gênero: Canis
  • Espécie: Canis lupus
  • Subespécie: Canis lupus familiaris
    (Obs: nosso cachorro é uma subespécie de lobo!)

Gato

  • Reino: Animalia
  • Filo: Chordata
  • Classe: Mammalia
  • Ordem: Carnivora
  • Família: Felidae
  • Gênero: Felinae
  • Espécie: Felis
  • Subespécie: Felis catus

Origens

Estudos sugerem que os cães compartilham uma linhagem comum originária do lobo cinzento (Canis lupus). Há evidências de múltiplos eventos de domesticação no Leste da Ásia, Oriente Médio e Europa, 20 a 40 mil anos atrás.

Já nosso relacionamento com o gato provavelmente teve início há cerca de 10 mil anos na região do Iraque, Síria, Líbano, Jordânia, Israel e Egito. O Felis sylvestris lybica, gato selvagem africano que caçava ratos nos assentamentos humanos, acabou se deixando domesticar pelos fazendeiros.

Comparativo humano x cão x gato

Humano

Cão

Gato

Superfície da mucosa olfativa

2 a 3cm²

60 a 200cm²

20cm²

Células olfativas

5 a 20 milhões

70 a 220 milhões

60 a 65 milhões

Papilas gustativas

9.000 papilas

1.700 papilas

500 papilas

Dentição

32 dentes

42 dentes

30 dentes

Mastigação

Excelente capacidade

Não mastigam ou mastigam pouco

Pouca ou moderada mastigação

pH do estômago

2 a 4

0,7 a 2

0,7 a 2

Duração do trânsito intestinal

30 horas a 5 dias

12 a 30 horas

12 a 24 horas

Fonte: Prof. Dominique Grandjean, 2003.

Digestão

Cães e gatos possuem mandíbulas poderosas e dentes especializados em dilacerar tecidos. O dentes molares, nas duas espécies, servem para esmigalhar ossos. Na saliva dos dois falta amilase, enzima que dá início à digestão de carboidrato, mas sobram elementos que defendem contra bactérias patogênicas (lisozima, lactoferrina, peroxidase etc). O alimento é ingerido em grandes nacos.

O pH do suco gástrico de ambos é muito mais ácido que o nosso, para digerir ossos e neutralizar bactérias. O estômago canino tem o dobro da capacidade expansiva do estômago felino. Nas duas espécies, o estômago representa mais de 60% do peso total do tubo digestivo. O intestino de ambos é mais curto e simples que o humano, possibilitando uma passagem rápida do alimento e menos tempo para a fixação de bactérias patogênicas.

Particularidades do gato

A evolução dotou os felinos de peculiaridades metabólicas que se alinham com sua dieta hipercarnívora. O organismo do gato utiliza proteína como fonte primordial de energia e é incapaz de desligar ou reduzir a utilização de proteína mesmo se faltar carne na dieta. Por esse motivo, mesmo gatos com comprometimento renal precisam consumir uma dieta razoavelmente protéica.

Habituado a obter de tecidos animais os nutrientes de que precisam, o gato é incapaz de converter o betacaroteno dos vegetais em retinol, a forma ativa da vitamina A. Também não transforma o triptofano em niacina (vitamina B3). Não produz taurina a partir de metionina ou cisteína – precisa ingeri-la pronta. Requer ácido araquidônico, ômega-6 presente na gordura das aves, e não aproveita ômegas-3 de origem vegetal. Em todos esses pontos o gato é diferente do cão.

Cães, gatos e o consumo hídrico

Nenhum animal evoluiu para consumir exclusivamente uma dieta seca, como a ração, que tem cerca de 9% de umidade. Estudos mostram que gatos que consomem ração seca podem levar 24h para beber a quantidade proporcional de água que um cão beberia em 1h. Descendente direto de um felino do deserto, o gato precisa “comer água” para sua saúde urinária e renal. Alimentação Natural (AN), sendo uma dieta com teor de água ao redor de 70%, proporciona isso.

Um pode comer a dieta do outro?

A dieta do gato saudável deve ser rica em proteína animal, moderada em gordura e baixa em carboidratos, e incluir taurina, niacina, ômegas-3 EPA e DHA e ácido araquidônico, além dos habituais manganês, cálcio, vitaminas E e D etc. Um cão saudável poderia consumir essa dieta. Mas o contrário seria arriscado, já que a dieta canina pode não conter taurina suficiente e outros nutrientes na forma exigida pelo organismo felino.

Sylvia Angélico
Médica Veterinária
pós-graduada em Nutrição Animal
CRMV-SP 29945

Comunicado Cachorro Verde

As informações divulgadas em nossas postagens possuem caráter exclusivamente educativo e não substituem as recomendações do médico-veterinário do seu cão ou gato. Por questões ético-profissionais, a Dra. Sylvia Angélico não pode responder certas dúvidas específicas sobre questões médicas do seu animal ou fazer recomendações para seu pet fora do âmbito de uma consulta personalizada. Protocolos de tratamento devem sempre ser elaborados e acompanhados pelo médico-veterinário de sua confiança.

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