A empresa americana AnimalBiome, fundada em 2016 por pesquisadores das universidades UC Davis e UC Berkeley, é pioneira em diagnósticos e terapias baseadas na microbiota intestinal de cães e gatos. Através de sua plataforma online, oferece kits para análise das microbiotas intestinal e oral, além de suplementos específicos e cápsulas contendo fezes de pets saudáveis, pré-selecionados, para a Terapia Restauradora da Microbiota Intestinal — o conhecido transplante de fezes.
No relatório anual “AnimalBiome’s State of the Gut Report”, a empresa trouxe alguns bons insights. Com dados de milhares de cães e gatos dos Estados Unidos, concluiu-se que 1 em cada 3 pets apresenta sintomas digestivos e/ou dermatológicos relacionados à disbiose, o desequilíbrio da microbiota intestinal. Esses resultados reforçam como esse problema é mais comum do que muitos tutores e até veterinários imaginam.
A pesquisa reflete bem o que vejo na prática. No início da minha carreira como veterinária focada em nutrição clínica, os casos crônicos digestivos eram menos comuns. Coceiras, sim, eram comuns. Hoje, noto um aumento significativo de casos desafiadores de cães com digestão extremamente sensível, intolerantes a diversos alimentos e muito sintomáticos. Isso é resultado de fatores combinados como genética, alimentos menos nutritivos e mais contaminados, exposição a toxinas ambientais, interrupção precoce da produção de hormônios sexuais, uso excessivo de certos medicamentos, sedentarismo, estresse, excesso de peso etc.
Recentemente compartilhei orientações práticas para lidar com episódios pontuais de fezes amolecidas, constipação e problemas nas glândulas adanais. Dicas como ter cuidado com alimentos laxativos, saber incluir fibras solúveis (psyllium), introduzir novas dietas gradualmente e reduzir o uso desnecessário de antibióticos são fundamentais. Prevenir a disbiose é mais fácil do que tratá-la uma vez instalada.
Ah! No Brasil, temos a Petbiomas, que também realiza análise da microbiota intestinal de cães e gatos via amostras de fezes. Vale a pena conhecer!
Confira o boletim de 2024 da AnimalBiome: https://www.animalbiome.com/pages/state-of-the-gut-2024)
O que é microbiota intestinal?
É a flora intestinal, ecossistema do trato digestório composto por trilhões de bactérias, vírus, fungos, protozoários e arquéias, fundamentais para uma capacidade digestiva, imunológica e metabólica normais do hospedeiro, além de produzirem vitaminas, neurotransmissores e hormônios. Cada microbiota é única nas suas proporções de espécies, número de colônias e diversidade de microorganismos.
E disbiose?
O equilíbrio entre as populações da microbiota pode ser perturbado por fatores como uso de antibióticos, toxinas, fármacos que alteram a digestão, como omeprazol, estresse, verminose e infecções. A microbiota sadia, que antes tinha uma maioria de microorganismos benéficos, pode se ver dominada por espécies patogênicas. Disbiose é o nome dado à microbiota alterada. As consequências podem ser inúmeras: sintomas digestivos, de pele, neurológicos etc.
A influência da dieta
Independentemente da modalidade escolhida a dieta deve ter fontes variadas de fibras que atuam como adubo das bactérias. Dietas muito ricas em gordura e/ou em carboidratos merecem cuidado, pois podem ser disruptoras para a microbiota no médio prazo. Igualmente importante é evitar alimentos que o pet não tolera bem, introduzir sempre aos poucos dietas e suplementos, não exagerar nas porções servidas e oferecer petiscos saudáveis com moderação.
Exercício
Existe uma associação direta entre exercício físico e a saúde da microbiota intestinal embora ela ainda não tenha sido totalmente desvendada pela Ciência. O impacto antiinflamatório da atividade física favorece a diversidade de espécies de microorganismos, além de regrar o funcionamento intestinal, o que reduz o risco de proliferação bacteriana excessiva, melhorar o sono e combater o estresse. Podendo ser ao ar livre, melhor ainda!
Pré, pró e pósbióticos
- Prebióticos: fibras não digeríveis (ex.: do brócolis) que alimentam bactérias benéficas.
- Probióticos: microrganismos vivos (ex.: lactobacilos) que trazem benefícios ao hospedeiro.
- Pósbióticos: compostos resultantes da fermentação pelas bactérias, como ácidos graxos de cadeia curta.Curiosidade: o chucrute é um exemplo raro que reúne os três papéis.
Uso consciente de antibióticos
Antibióticos são os fármacos que mais afetam a microbiota. Colônias inteiras podem não retornar da forma como existiam antes. Quando antibiótico realmente for indicado, converse com a veterinária sobre administração concomitante da levedura probiótica Saccharomyces boulardii para minimizar os prejuízos, capriche em atividade física e fibras prebióticas: chicória, aspargo, banana (mais para verde), brócolis, bardana, cogumelos, batata-doce e yacón.
Tipos de disbiose intestinal
A disbiose pode acontecer porque microorganismos importantes estão presentes em proporções inadequadas. E/ou por total ausência de certas espécies benéficas – essa foi a ocorrência mais verificada pela AnimalBiome. E/ou por predominância de bactérias patogênicas. Os sintomas podem demorar a aparecer, mas os mais frequentes são diarréia, coceira, constipação, cólica e ruídos digestivos, vômito ou regurgitação, gases, mau hálito e cansaço.
A microbiota de pets idosos
De acordo com a AnimalBiome, o gato idoso tende a apresentar declínio na população de Clostridium hiranonis, bactéria importante para a digestão e inibibora de bactérias perigosas, como Clostridium difficile e Escherichia coli. Cães (e humanos) idosos também têm redução de indivíduos importantes, além de uma perda geral de diversidade de espécies, o que torna o intestino e o hospedeiro mais vulnerável a quadros infecciosos e inflamatórios.
A responsabilidade é nossa
Escolhas diárias aparentemente banais que fazemos têm o poder de proteger ou alterar a microbiota intestinal dos pets, o que determina diretamente o quão saudáveis eles serão. Reduzir exposição a toxinas, questionar prescrição casual de antibiótico, servir uma dieta natural variada e equilibrada, garantir atividade física e combater o estresse são decisões nossas do dia-a-dia.
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Sylvia Angélico
Médica Veterinária
pós-graduada em Nutrição Animal
CRMV-SP 29945
Comunicado Cachorro Verde
As informações divulgadas em nossas postagens possuem caráter exclusivamente educativo e não substituem as recomendações do médico-veterinário do seu cão ou gato. Por questões ético-profissionais, a Dra. Sylvia Angélico não pode responder certas dúvidas específicas sobre questões médicas do seu animal ou fazer recomendações para seu pet fora do âmbito de uma consulta personalizada. Protocolos de tratamento devem sempre ser elaborados e acompanhados pelo médico-veterinário de sua confiança.
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