fbpx

É super importante falar sobre diabetes mellitus em cães e gatos. Não só porque é uma séria doença crônica. Mas porque o tutor é peça central tanto na prevenção como no controle do diabetes no dia-a-dia.

Nos últimos 20 anos mais e mais pets vêm sendo diagnosticados com diabetes. O relatório de 2016 da rede norte-americana Banfield Pet Hospitals informou um aumento de 80% nos casos em cães e 18% nos gatos, entre 2006 e 2015. O cenário é ainda mais preocupante na Inglaterra, onde entre 2011 e 2016 houve um crescimento de 850% da doença em cães e acima de 1.000% nos gatos, segundo a seguradora Animal Friends.

É urgente entendermos como estamos contribuindo com o desenvolvimento desse quadro nos nossos pets. Mas antes precisamos entender um pouco sobre a doença.

O diabetes mellitus ocorre quando o corpo não consegue utilizar adequadamente o principal combustível celular: a glicose (um tipo de açúcar). Quem controla os níveis de glicose no sangue é a insulina, hormônio produzido no pâncreas. A insulina atua como uma chave abrindo as portas das células para deixar a glicose entrar. Quando o pâncreas do animal não produz insulina suficiente ou quando as células passam a resistir ao efeito da insulina, falta glicose dentro das células e sobra glicose no sangue – a famosa hiperglicemia. Essa situação gera uma cascata de problemas.

O acúmulo de acúcar no sangue chega a um ponto que transborda na urina, atraindo consigo muita água. É por isso que o pet diabético faz tanto xixi e, para não desidratar, bebe tanta água. Essa glicose toda na urina é prejudicial aos rins e um “convite VIP” para bactérias – por isso o diabetes favorece cistites. Enquanto isso, as células do pet, privadas de glicose, estão literalmente passando fome. Na tentativa de fazer algum combustível chegar nas células, o corpo mobiliza as próprias reservas de músculo e gordura e ativa no máximo o apetite do animal. E assim temos um cão ou gato que come vorazmente e mesmo assim perde peso.

Quer saber sobre fatores de risco, sinais clínicos, diagnóstico, controle, dieta e prevenção dessa importante endocrinopatia? Confira essa postagem.

Tipo I ou Tipo II?

Em humanos, o diabetes é classificado em Tipo I ou Tipo II. O Tipo I é bastante visto em jovens e sua causa é a destruição imune-mediada das células beta, produtoras de insulina no pâncreas. No Tipo II a produção de insulina é normal, mas o organismo responde mal a ela (resistência insulínica).

Para pets essa classificação não se aplica tanto. Tanto cães como gatos costumam desenvolver diabetes mais velhos, mas nos cães a causa mais comum é a destruição das células beta, e nos gatos, a resistência insulínica.

Idade, gênero, raça

Embora apareça em pets jovens e até de forma transitória em fêmeas prenhes, o diabetes é tipicamente diagnosticado em cães entre 7 a 10 anos e em gatos a partir de 10 anos de idade. Na espécie canina é mais prevalente em cadelas; e na felina, nos machos. Raças comumente diagnosticadas incluem Poodle, Schnauzer, Beagle e Dachshund e entre as felinas, Burmês, Abissínio, Sagrado da Birmânia e Norwegian Forest. Mas qualquer pet, com ou sem raça definida, pode desenvolver a doença.

Fatores de risco

Previna o excesso de peso. O gato obeso têm 4x mais chance de ficar diabético. Sedentarismo também favorece resistência insulínica e obesidade. Doenças como hipertiroidismo no gato, hiperadrenocorticismo no cão, pancreatite, doença periodontal e disbiose intestinal também aumentam o risco. O abuso de corticóides também contribui, assim como a ingestão excessiva de carboidratos. A dieta natural felina tem menos de 5% de carboidratos, enquanto a ração seca pode ter 30% a 50% desse macronutriente – a receita da hiperglicemia e do ganho de peso.

Sinais clínicos

  • Beber muita água e, consequentemente, urinar muito mais
  • Perda de peso, mesmo comendo muito
  • Olhos nebulosos (principalmente em cães)
  • Infecções urinárias (cistites) de repetição
  • Doença renal (principalmente em gatos)
  • Cansaço e fraqueza

Ao notar quaisquer desses sinais clínicos, consulte a veterinária. Quanto mais cedo for feito o diagnóstico, melhor será o prognóstico.

Diagnóstico

Mediante suspeita de diabetes, dosa-se a taxa de glicose (e/ou frutosamina) no sangue do cão ou gato em jejum e também a glicose ou corpos cetônicos na urina. Resultados positivos, associados aos sinais clínicos do animal, fecham o diagnóstico. Em cães sadios, sem sinais clínicos de diabetes, pode-se avaliar o risco de desenvolver diabetes dosando insulina em jejum e hemoglobina glicada.

Manejo do diabetes

O objetivo é manter concentrações aceitáveis de açúcar no sangue, controlar os sinais clínicos do diabetes e prevenir complicações como catarata e cistite. Com a orientação do veterinário, o tutor aprende a administrar diariamente a insulina, servir uma dieta adequada nos horários combinados, monitorar a glicemia, atentar para sinais de hiper e hipoglicemia e se compromete a passar feedbacks constantes e a realizar os exames periódicos de controle.

Atividade física

A atividade física aeróbica regular é uma das práticas promotoras de saúde mais negligenciadas pelos tutores de cães e gatos. Na prevenção e manejo do diabetes ela tem importância tripla: controla a resistência insulínica, preserva massa magra e previne o sobrepeso. Encontre espaço na rotina para proporcionar pelo menos 20-30 minutos diários de atividade aeróbica para seu cão e pelo menos 10-20 minutos para seu gato (brincadeira de varinha etc).

Dieta

A meu ver, pets diabéticos devem, quando possível, receber uma dieta rica em proteína, moderada em gordura e baixa em carboidratos. Também já formulei para cães sem histórico de pancreatite dietas com níveis similares de gordura e proteína, mantendo o carboidrato baixo, com bons resultados. É importante contar com um veterinário atuante em nutrição clínica, porque idade, sinais clínicos, tratamento, escore corporal e comorbidades influenciam a escolha da dieta.

Para lembrar

Dá trabalho, mas com diagnóstico precoce, monitoramento e manejo, pets diabéticos podem viver bem por bastante tempo. Felizmente, essa é uma doença que pode ser amplamente evitada através de uma rotina com dieta regrada, controle do peso, atividade física regular e cuidado com o uso casual de corticóides. Quer outro motivo para se importar? Um estudo de 2020 sugere que tutores de pets diabéticos têm 38% mais chance de também desenvolverem a doença.

Referências:

  1. The shared risk of diabetes between dog and cat owners and their pets: register based cohort study, 2020. doi: https://www.bmj.com/content/371/bmj.m4337
  2. Diabetes mellitus em cães e suas complicações, 2009. https://repositorio.unesp.br/bitstream/handle/11449/119448/imai_ph_tcc_botfmvz.pdf?sequence=1 1
  3. Diabetes in Pets, AVMA https://www.avma.org/resources/pet-owners/petcare/diabetes-pets
  4. Canine and Feline Diabetes Mellitus: Nature or Nurture, Journal of Nutrition, 2004, https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0022316623030031?via%3Dihub
  5. Effect of Dietary Carbohydrate, Fat, and Protein on Postprandial Glycemia and Energy Intake in Cats, 2013. https://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/jvim.12139
  6. Feline Diabetes, Cornell Feline Health Center https://www.vet.cornell.edu/departments-centers-and-institutes/cornell-feline-health-center/health-information/feline-health-topics/feline-diabetes

 

Sylvia Angélico
Médica Veterinária
pós-graduada em Nutrição Animal
CRMV-SP 29945

Comunicado Cachorro Verde

As informações divulgadas em nossas postagens possuem caráter exclusivamente educativo e não substituem as recomendações do médico-veterinário do seu cão ou gato. Por questões ético-profissionais, a Dra. Sylvia Angélico não pode responder certas dúvidas específicas sobre questões médicas do seu animal ou fazer recomendações para seu pet fora do âmbito de uma consulta personalizada. Protocolos de tratamento devem sempre ser elaborados e acompanhados pelo médico-veterinário de sua confiança.

Obrigada por acompanhar os canais do Cachorro Verde!