Os cães geralmente são um “saco sem fundo”, estão sempre implorando por mais comida e costumam adorar Alimentação Natural. Mas de vez em quando acontece de eu atender um paciente que dá um trabalhão para comer bem. É o caso daquele peludo que ontem amou jantar carne moída com batata-doce, mas que hoje nem quis olhar para a mesma refeição. Tem também aquele cachorro que recusa terminantemente comida oferecida pela manhã e só demonstra interesse por jantar bem mais tarde. E já vi aquele cão que claramente está com fome, mas hesita em comer. Vai até a vasilha, cheira, cheira, mas não dá uma mordidinha sequer.
Situações assim podem ser incrivelmente frustrantes, principalmente quando você dedicou tanto amor (e trabalho) ao preparo das marmitas do peludo. Em casos crônicos, o cãozinho pode até começar a perder peso ou a ficar doente por não estar bem nutrido, e aí a coisa fica especialmente preocupante.
Você enxergou o seu cão em algum dos exemplos acima? Vamos entender o que pode estar por trás desses comportamentos e como ajudar o seu pet a fazer as pazes com as refeições.
Causas do “apetite de passarinho”
Antes de mais nada, é super importante diferenciar o apetite seletivo ocasional do apetite cronicamente seletivo. Quando estão com muito calor, com dor, assim que voltam de um procedimento com anestesia, quando estão muito estressados (por exemplo, ao chegar a uma nova casa ou a um hotel ou durante um vôo de avião) é normal que os cães não dêem a mínima para comida. Cadelas no cio – e os cães machos não-castrados que estão convivendo com elas – também podem ter o apetite muito diminuído.
Há casos, entretanto, em que a falta de vontade de se alimentar pode ser sintoma de algum problema de saúde, como doença renal crônica, hepatite, cólica intestinal, constipação ou uma disfunção endócrina conhecida como hipoadrenocorticismo (ou Doença de Addison). É por isso que é tão importante procurar o vet de sua confiança e pedir aquele exame caprichado do seu cachorro, com direito a palpação do abdomen e a exames de sangue e até de imagem, como a ultrassonografia abdominal. Se uma doença for diagnosticada o tratamento adequado certamente ajudará a restabelecer o apetite do seu amigão.
Já vi situações em que a inapetência era causada por um olfato fraco. Alguns cães de raças braquicefálicas, especialmente buldogues franceses, podem ter de nascença as narinas tão fechadinhas, mas tão fechadinhas, que o faro fica prejudicado. Vamos combinar que é muito difícil ter vontade de comer com o nariz entupido, né? Com os cães é a mesma coisa. Nos casos mais extremos que atendi de narinas em fenda foi indicado um procedimento cirúrgico para alargar as narinas e restabelecer o olfato do paciente.
Mas calma. A maioria dos casos de apetite difícil felizmente não requer soluções cirúrgicas! Vejamos maneiras bem mais tranquilas de dar aquele “up” na fome do peludo.
Corte lanchinhos e petiscos
Cães de apetite fraco são como crianças que não comem bem: se ficarem beliscando uma guloseima aqui, outra ali, não terão fome para as refeições. Então combine com o vovô, com o papai, com a funcionária, com o moço do banho e tosa, com a criança em casa: ninguém deve dar nenhum pedacinho de nada ao peludo, salvo quando ele voltar a se alimentar bem e de forma regrada. Percebo, sem exagero, que a oferta excessiva de petiscos (e a ração mantida à vontade) costumam ser a causa mais comum do apetite seletivo. Ainda mais quando a guloseima é algo irresistível, feito com farinha ou cheio de açúcar, sal ou carnes processadas, como bifinhos, salsicha, biscoitos, queijo, pão, borda de pizza etc. Além de fazerem mal, essas comidas viciam o cão e podem tornar o paladar dele imune aos encantos sutis dos alimentos saudáveis.
Peludo acima do peso é mais exigente
Essa é uma situação clássica, que vejo toda semana. É o cão gordinho que “pesca” as carnes e vísceras da dieta, mas deixa sem dó os vegetais. Ele tem fome, até pede comida, mas não é tudo o que ele gosta. Pois bem. Quando estão acima do peso, os cães secretam grande quantidade de hormônios de saciedade – grelina e leptina – até como forma do organismo refrear a ingestão de calorias. É como se o corpo estivesse tão bem servido de reservas que se dá o luxo de escolher o que vai entrar. Mas basta emagrecer o cão que essa exigência toda passa. Para isso, sirva porções menores e corte totalmente os petiscos. Procure implementar uma rotina de atividade física, respeitando sempre os limites do seu cão e contando com acompanhamento veterinário para prevenir injúria ortopédica.
Valorize a refeição
Na hora de servir, que tal esquentar de leve a porção na frigideira com um fio de azeite e uma pitada de ervas (como salsinha, orégano ou outra da preferência do peludo)? Não há nada mais apetitoso que uma comida com jeito de recém-preparada e cheirosa para atiçar os sentidos. Experimente adicionar sobre a refeição um pouco de caldo caseiro morno de ossos (receita aqui: https://www.cachorroverde.com.br/caldo/) para dar aquele toque especial. Até meus pacientes em estágio terminal de doenças adoram tomar esse caldo. Se você compra Alimentação Natural comercial já pronta pode ser que as porções estejam congeladas há tanto tempo que tenham perdido um pouco do cheiro e do sabor. Nesse caso pode ser especialmente importante sempre aquecer e temperar de leve a refeição antes de servir. Considere também o tamanho dos pedaços de vegetais, que geralmente são os alimentos menos preferidos dos cães. Veja se seu cãozinho prefere, por exemplo, que os vegetais sejam triturados em processador juntamente com um pouco da carne ou do fígado (para disfarçá-los) ou se prefere servidos em pedacinhos.
Varie a composição da receita
Ninguém gosta de comer todo santo dia a mesma comida e seu cachorro não é exceção. Sempre que possível, procure variar entre carne bovina, carne de frango, carne suína magra e/ou filé de peixe sem espinhas. Se você oferece AN Cozida, não fique só no arroz integral. Varie o carboidrato, trocando o arroz por mandioquinha ou por batata-doce ou inhame. Rotacione os vegetais; faça uma receita com cenoura, vagem e brócolis. E outra com chuchu, abobrinha e um pouquinho de rúcula picadinha, por exemplo. E assim por diante.Para deixar tudo mais prático, prepare de duas a quatro marmitas diferentes, congele, e todo dia descongele e sirva uma. Pedacinhos de fígado cozido ou desidratado, ou de ovo cozido ou mexido amassadinho ou pequena quantidade de cottage ou ricota sobre a refeição também atuam como coberturas apetitosas para muitos cães.
Ele prefere comer mais tarde? Tudo bem.
Assim como algumas pessoas não ligam para o café-da-manhã há cães que não aceitam comer nada antes das 18h. Desde que esse período de jejum não esteja provocando episódios de vômito matinal, não há problema em fazer a vontade do cachorro. Veja se ele fica bem com uma refeição servida às 18h e outra servida às 22h. Ou até se ele prefere comer uma única vez no dia. Conheço cachorros que por conta própria fazem um dia inteirinho de jejum de sólidos toda semana. Jejuar de maneira intermitente e comer bastante de uma única vez faz parte da rotina dos lobos, os ancestrais dos nossos peludos. O que não vale é ficar oferecendo alimentos deliciosos para o cão como forma de estimulá-lo a comer algo pela manhã. A intenção é boa, mas ao fazer isso é como se você dissesse “tome aqui um queijo por não ter comido a refeição”. Sem querer você reforça essa recusa.
Cão exercitado é cão com fome
A prática regular de atividade física gera demanda por nutrientes e calorias. É por isso que essa é uma das dicas mais eficientes para estimular o apetite dos cães. Não raro cachorros que comem mal são sedentários. Ou no máximo dão aquela voltinha de 10 minutos no quarteirão de vez em nunca. Mães de crianças que comem mal sabem o bem que faz aos pimpolhos a prática regular de natação e caratê. Comece exercitando seu cão por 20 minutos todos os dias. Vinte minutinhos. Aumente a intensidade e tente instituir pelo menos dois passeios diários vigorosos de 20 minutos cada. Você verá a diferença que o exercício fará no apetite, sem contar os benefícios à saúde física e mental do seu peludo (e sua)! 😉
Comunicado do site Cachorro Verde
As informações divulgadas em nossas postagens possuem caráter exclusivamente educativo e não substituem as recomendações do médico-veterinário do seu cão ou gato. Por questões ético-profissionais, a Dra. Sylvia Angélico não pode responder certas dúvidas específicas sobre questões médicas do seu animal ou fazer recomendações para seu pet fora do âmbito de uma consulta personalizada. Protocolos de tratamento devem sempre ser elaborados e acompanhados pelo médico-veterinário de sua confiança. Obrigada por acompanhar os canais do Cachorro Verde!