Cada cachorro e gato é único, com suas particularidades, um verdadeiro indivíduo. Em quase 14 anos de prática em nutrição clínica, constatei o quanto isso é verdade. O sistema de cuidados mais eficiente é aquele que leva em consideração essas singularidades. Por exemplo, minha saudosa cachorrinha Polly piorava da gastrite ao tomar omeprazol, mas melhorava com chá de espinheira-santa. Já meu gato Frajola apresenta melhor controle de sua constipação crônica quando adiciono à sua dieta a fibra FiberMais, em comparação com outros suplementos de fibras.
Dito isso, há certas peculiaridades bastante interessantes que observo com frequência em raças específicas de cães e gatos, e acredito ser interessante que essas informações sejam conhecidas por tutores e pelos veterinários que cuidam desses pets.
A seleção genética das raças caninas e felinas desempenhou um papel significativo no desenvolvimento das tendências que hoje observamos nesses animais. Por meio de cruzamentos seletivos, foram acentuadas características físicas e comportamentais desejáveis, mas também surgiram predisposições a determinadas quadros de saúde que se repetem com maior frequência em algumas raças.
Nos quadrinhos desta postagem, compartilho alguns deles e situações que atendo regularmente nesses peludos. É claro que a lista poderia ser muito maior, então convido você a contribuir nos comentários, trazendo outras particularidades que dizem respeito à dieta que você observa como frequentes em certas raças de cães e gatos.
Dálmata
As purinas, compostos presentes nos alimentos, são normalmente quebradas em ácido úrico e convertidas em alantoína, que é então eliminada pela urina. Mas muitos Dálmatas não convertem bem o ácido úrico em alantoína e formam cálculos urinários de urato.
Nesses casos recomenda-se uma dieta com baixo teor de purinas (restrita em vísceras, levedura de cerveja, sardinha e anchovas), favorecer um pH urinário mais alcalino e diluir a urina, servindo, por exemplo, porções de água saborizadas com iogurte ou caldo do cozimento das carnes.
Schnauzer
O barbudo tem tendência à dislipidemia, aumento das taxas séricas de gorduras por ineficiência na quebra de triglicerídeos por alterações na enzima lipase lipoprotéica e/ou remoção inadequada das lipoproteínas ricas em triglicerídeos no sangue. A condição predispõe à pancreatite, hepatopatias e até episódios de convulsão. O quadro também é comum no Pastor de Shetland. Dieta com menos gordura, suplementação diária com ômega-3 e fibras, peso enxuto e atividade física aeróbica regular previnem e combatem o problema.
O Schnauzer, principalmente o miniatura, também tem predisposição a apresentar cálculos urinários. Por isso inclua a ultrassonografia abdominal e a urinálise (urina tipo I) na lista de exames periódicos desses cães. A composição e formulação da dieta vai variar bastante dependendo do material que formar os cristais e cálculos encontrados. Mas todo pet predisposto a formação de sedimentos na urina se beneficia de ingerir mais água e fazer xixi pelo menos 4 a 5 vezes ao longo do dia.
Spitz Alemão
Quem trabalha com nutrição clínica sabe bem como é desafiador emagrecer esses baixinhos, em especial os castrados. Outras raças bastante predispostas ao sobrepeso e obesidade são Pug, Beagle, Labrador e Golden. A melhor maneira de lidar com o excesso de peso é evitando que seu pet o desenvolva. Se acontecer, reduza a ingestão de calorias e, se possível, aumente a demanda energética (exercite regularmente o peludo).
Husky Siberiano e Malamute do Alaska
Acredita-se que essas raças nórdicas não absorvem bem o zinco da dieta. Por séculos, sua alimentação se baseou em carnes ricas em zinco, como alce, focas e ursos, além de salmão e arenque. A deficiência desse mineral leva a falhas de pelagem ao redor dos olhos e boca e maior suscetibilidade a infecções. Sirva uma dieta rica em zinco (carne bovina, mexilhões e vísceras são ótimas fontes) e pobre em fitatos, elementos dos grãos e cereais que reduzem a absorção intestinal de zinco.
Cavalier King Charles Spaniel
Esse cãozinho tem tendência a desenvolver mesmo bem jovem a doença valvar mitral, caracterizada pela degeneração da valva mitral do coração. Recomenda-se começar a investigar essa condição em cães de 1 ano de idade. Pela minha experiência, uma dieta rica em carnes magras, suplementada diariamente com ômegas-3 EPA e DHA (75mg de ambas somadas por kg de peso), além de nutracêuticos como coenzima Q10, L-carnitina e L-taurina, e controle do peso e ajudam tremendamente.
Chihuahuas
Uma parcela considerável desses pequenos tem quadros digestivos crônicos, em especial, digestão lenta gerando gases e cólica, gastrite, duodenite e refluxo gastroesofágico. Gosto de indicar uma dieta de fácil digestão (baixa em gorduras, baixa fibra, sem alimentos fermentativos), além de caldo de ossos, zeólita, enzimas digestivas e chás com ação digestiva (hortelã, erva-doce e espinheira-santa). Procure uma veterinária nutróloga experiente em quadros digestivos para individualizar essa conduta.
Golden Retriever
Atualmente estes são os cães que mais comumente desenvolvem câncer. Cânceres frequentes nos dourados incluem hemangiossarcoma, osteossarcoma, mastocitoma e linfoma. Para reduzir o risco do desenvolvimento precoce de neoplasias exercite seu cão diariamente, mantenha-o esbelto, evite aplicação desnecessária de pesticidas tópicos, sirva Alimentação Natural variada, enriquecida diariamente com ômegas-3 e antioxidantes (amoras, gengibre, cúrcuma, chá verde descafeinado, spirulina etc).
Westies
Esses branquelos, assim como Shar Pei e algumas outras raças, são comumente afetados pela atopia ou dermatite atópica, alergia que tem como gatilhos a exposição a alérgenos como pólen, ácaros, poeira e bolores. A atopia não costuma ser responsiva a dietas hipoalergênicas, mas fatores dietéticos podem ajudar a modulá-la, como administração diária de ômegas-3 EPA e DHA, zinco, biotina, além do flavonóide quercetina e de vegetais prebióticos, como alcachofra, nabo, batata yacón, banana verde, chicória e um pouquinho de alho (perfeitamente seguro aos pets).
Maine Coon e Ragdoll
Esses gatões são predispostos à cardiomiopatia hipertrófica, condição genética que afeta até 30% dos Ragdolls. O quadro pode ser assintomático ou levar a quadros graves, como insuficiência cardíaca congestiva, arritmias e até morte súbita. O tratamento de controle é fundamental, mas fatores dietéticos têm importante papel complementar: dieta rica em carnes, ômega-3 EPA e DHA diário, taurina, L-carnitina, coenzima Q10, magnésio e polifenóis como os encontrados nas amoras.
Sylvia Angélico
Médica Veterinária
pós-graduada em Nutrição Animal
CRMV-SP 29945
Comunicado Cachorro Verde
As informações divulgadas em nossas postagens possuem caráter exclusivamente educativo e não substituem as recomendações do médico-veterinário do seu cão ou gato. Por questões ético-profissionais, a Dra. Sylvia Angélico não pode responder certas dúvidas específicas sobre questões médicas do seu animal ou fazer recomendações para seu pet fora do âmbito de uma consulta personalizada. Protocolos de tratamento devem sempre ser elaborados e acompanhados pelo médico-veterinário de sua confiança.
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