fbpx

Você já ouviu falar que o alho é um alimento perigoso para cães e gatos. Mas será que esse alerta é inteiramente verdadeiro? Vem comigo!

Quando comecei a estudar dietas caseiras para pets, há quase 15 anos, descobri veterinários que recomendavam em seus livros a oferta de pequena quantidade de alho fresco a cães (não para gatos) por seus benefícios à saúde. Livros como “Natural Health Bible for Dogs & Cats”, do Shawn Messonier, “Dr. Pitcairn’s Complete Guide to Natural Health for Dogs and Cats”, do Richard Pitcairn Ph.D e “The Nature of Animal Healing” do Martin Goldstein.

Desde 2008, ofereço um pouquinho de alho aos meus cães, acompanho cães que o consomem e oriento sobre alho nos materiais do meu site e cursos. Nunca vi um cachorro desenvolver anemia hemolítica por consumo de alho.

De onde vem essa campanha anti-alho para os cães?

O alho é “parente” da cebola, alimento que realmente deve ser evitado para pets. A cebola concentra tiossulfato, que se ingerido em grandes quantidades por cães e gatos pode causar anemia hemolítica. Só que o alho tem 10x menos tiossufato que a cebola. Tanto é que até a década de 1990, óleo de alho e alho em pó eram amplamente empregados na formulação de rações e petiscos como bons palatabilizantes naturais.

A percepção sobre a segurança do alho mudou no ano de 2000, quando cientistas japoneses publicaram um estudo controverso. Eles administraram por sonda intragástrica extrato de alho a cães por 7 dias seguidos. Cada cão tomou 1,25ml de extrato de alho por kg de peso. Essa dosagem equivale a forçar um cão de 25kg a ingerir 25 dentes de alho por dia durante uma semana – 175 dentes de alho no total! Essa quantidade absurda de alho está infinitamente acima do que se indica oferecer aos cães.

O curioso é que, mesmo comendo tanto alho, nenhum cão do estudo morreu ou teve sintomas. Mas foram observadas alterações em suas hemácias, associadas a estresse oxidativo. Foi com base nesse estudo e no medo (justificado) da cebola que o alho passou a figurar em listas de alimentos perigosos para cães e gatos.

A indústria de alimentos para pets, contudo, solicitou revisão desse estudo, porque a metodologia não refletia a realidade de utilização do alho. A mesma equipe de pesquisadores japoneses concordou em revisitar o experimento e, em trabalho publicado em 2004, concluiu que o alho é seguro para cães e que inclusive é benéfico à saúde deles.

Com isso, o alho foi reinserido como um ingrediente válido no manual de entidades que orientam a formulação de alimentos comerciais, como a AAFCO. E o bulbo voltou à composição de várias dietas e petiscos.

A questão é que ainda hoje muitos sites e entidades mantêm informações cientificamente defasadas sobre a oferta de alho para cães.

Benefícios da oferta de alho

Com base em estudos científicos a inclusão regular de um pouco de alho à dieta dos cães pode:

  • inibir a formação de coágulos
  • melhorar a resposta imunológica
  • aumentar a resistência a vermes, pulgas, carrapatos e mosquitos
  • diminuir níveis de glicose, triglicérides e colesterol no sangue
  • beneficiar a saúde cardiovascular
  • elevar os níveis de antioxidantes
  • modular processos inflamatórios e alergias
  • prevenir e auxiliar no tratamento de infecções diversas
  • reduzir o risco de câncer

Alicina!

O elemento do alho que é responsável por tantos benefícios à saúde se chama alicina. Mas ela não está presente no alho. É quando trituramos, cortamos fininho ou mastigamos o alho cru que a enzima alinase se associa à proteína aliina e, em cerca de 10 minutos, forma-se a poderosa alicina! Por isso, nada de oferecer alho em pedaços. É fundamental triturá-lo.

Como usar?

Esqueça alho em cápsulas, óleo de alho, alho em pó, alho frito, óleo essencial de alho e aqueles potes de alho cru já triturado (vendidos no supermercado) e extrato de alho (que inclusive vimos que é tóxico para cães). Esses não têm padronização do teor de alicina e geralmente contêm aditivos.

Use alho in natura, cru, esse que você tem na cozinha.

Corte o dente de alho (com ou sem casca) bem fininho, aguarde 10 minutos, e misture os pedacinhos na refeição do seu cão. Triture/pique sempre na hora de servir.

Dosagem:

Considerando 1 dente de alho normal (3g a 4g):

Cães
– Porte miniatura (até 5kg): 1/8 a 1/6 de um dente de alho por dia
– Porte pequeno (5-10kg): 1/4 a 1/2 de um dente de alho por dia
– Porte médio (10-22kg): 1/2 a 1 dente de alho por dia
– Porte grande e gigante: 1 a 1 1/2 dente de alho por dia

Administre essa medida de alho 3x por semana. Se preferir fazer uso diário, recomendo suspender por 15 dias a cada 2 meses.

E para gatos?

A julgar pelo histórico seguro de utilização de alho em alimentos comerciais para gatos nas últimas 3 a 4 décadas, um tiquinho de alho deve ser seguro. Um boletim de 2008 da entidade “National Research Council” nos Estados Unidos indica 1/25 (sim, um vigésimo) de um dente de alho como dose segura para gatos. Difícil de dosificar, né? Uma lâminazinha transparente, de tão fininha.

Como não há estudos suficientes sobre a segurança do alho para felinos, pelo sim, pelo não, muitos veterinários preferem não recomendar a oferta do bulbo aos bichanos.

Contraindicações:

O alho pode interferir no efeito de certos fármacos, como os anticoagulantes. Sempre consulte a bula. Medicamentos homeopáticos podem perder o efeito se administrados juntamente com alho.

Cães de raças japonesas (como Shiba e Akita) são mais sensíveis ao tiossulfato – para esses utilize metade da dosagem sugerida ou mais esporadicamente.

Como o alho “afina” o sangue, deve ser evitado para cães com anemia, contagem baixa de plaquetas, doença do carrapato e trombocitopenia imunemediada.

Alho é rico em fibras e enxofre. Se notar que seu cão não reagiu bem a ele (teve gases, cólica etc) sirva metade da dose ou suspenda a oferta.

O alho é considerado seguro a cadelas lactantes, mas pode mudar o sabor do leite e gerar rejeição nos bebês. Recomenda-se não oferecê-lo nessa fase ou introduzi-lo de maneira bem gradativa.

Dúvidas frequentes:

Posso cozinhar a comida do cão com alho?
Pique o alho, aguarde 10 minutos, e então use os pedacinhos no cozimento. Mas saiba que os efeitos serão sempre mais potentes com alho fresco, cru. (Cebola, nem pensar, hein?)

O que faço com o dente de alho que sobrou?
Envolva-o em plástico filme e guarde em pote tampado na geladeira. Ao pegá-lo para novo uso, corte e despreze a primeira fatia.

Posso guardar alho já picadinho em pote na geladeira?
Ele é sempre mais potente quando picado ou triturado no momento de oferecer, já que suas propriedades reagem com o oxigênio.

Referências

  1. Vídeo imperdível da Karen Becker e do Rodney Habib sobre o mito do alho ser tóxico a cães: https://www.youtube.com/watch?v=lbx-unN011Q
  2. Hematologic changes associated with the appearance of eccentrocytes after intragastric administration of garlic extract to dogs, 2000. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/11108195/
  3. Acceleration of superoxide generation in polymorphonuclear leukocytes and inhibition of platelet aggregation by alk(en)yl thiosulfates derived from onion and garlic in dogs and humans, 2004. https://www.plefa.com/article/S0952-3278(03)00158-3/fulltext
  4. Safety and efficacy of aged garlic extract in dogs: upregulation of the nuclear factor erythroid 2-related factor 2 (Nrf2) signaling pathway and Nrf2-regulated phase II antioxidant enzymes, 2018. https://bmcvetres.biomedcentral.com/articles/10.1186/s12917-018-1699-2
  5. Garlic – well-rounded and safe for your practice, 2017. https://ivcjournal.com/garlic/
  6. Chemical Constituents and Pharmacological Activieties of Garlic (Allium sativum L.): a Review, 2020. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/32213941/
  7. Phytochemicals of garlic: Promising candidates for cancer therapy, 2019. https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0753332219353521?via%3Dihub
  8. Review: antimicrobial properties of allicin used alone or in combination with other medications, 2020. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/32207097/
  9. Garlic Lowers Blood Pressure in Hypertensive Individuals, Regulates Serum Cholesterol, and Stimulates Immunity: An Updated Meta-analysis and Review, 2016. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/26764326/
  10. The effects of different plant extracts on nematodes, 2011. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/21110041/

 

Sylvia Angélico
Médica Veterinária pós-graduada em Nutrição Animal
CRMV-SP 29945

Comunicado Cachorro Verde

As informações divulgadas em nossas postagens possuem caráter exclusivamente educativo e não substituem as recomendações do médico-veterinário do seu cão ou gato. Por questões ético-profissionais, a Dra. Sylvia Angélico não pode responder certas dúvidas específicas sobre questões médicas do seu animal ou fazer recomendações para seu pet fora do âmbito de uma consulta personalizada. Protocolos de tratamento devem sempre ser elaborados e acompanhados pelo médico-veterinário de sua confiança.

Obrigada por acompanhar os canais do Cachorro Verde!